Uma história de violência, injustiça e morte no Sertão
Vítimas da injustiça // Dois jovens confundidos com bandidos. Um morre, em decorrência de espancamento, e outro fica preso durante 38 dias. Famílias querem, agora, punição
Ed Wanderley e Rafael Dias // Do diariodepernambuco.com
Ed Wanderley e Rafael Dias // Do diariodepernambuco.com
Dois jovens, dois inocentes e uma sucessão de erros, barbárie e tortura. Negros, vítimas do preconceito que não ficou apenas sob o véu da injúria verbal. Vítimas da sede de vingança cega. No último dia 10 de janeiro, José Alex Soares da Silva, 19, e Diego Pereira Cruz, 18, pagaram o preço de terem sido confundidos com bandidos que tinham praticado um suposto assalto a um posto de gasolina. Eles voltavam de uma pelada num campo de várzea, por volta das 19h, em Petrolina, no Sertão.
Ao pararem para abastecer a moto no posto Paizão, na BR-428, foram acusados pela proprietária do posto Umburuçu, que fica próximo, de serem os autores do crime, ocorrido minutos antes. Sem a mínima chance de alegarem defesa, foram brutalmente espancados por seguranças e motoristas que haviam sido vítimas dos bandidos no posto anterior. José Alex morreu três dias depois no Hospital de Traumas de Petrolina em virtude das fortes agressões. Diego sobreviveu, mas com marcas no corpo e na alma.
Confira o especial sobre o caso
A história de injustiça, violência e morte está narrada no inquérito policial entregue ontem à Central de Inquéritos do Ministério Público de Pernambuco em Petrolina. O documento pede o indiciamento de cinco suspeitos pelo crime de homicídio e lesão corporal. Diego Pereira Cruz acusa policiais militares de o terem espancado em um matagal e na delegacia para onde foi levado depois de ter recebido alta do hospital, na mesma noite. A suposta violência policial será investigada em um segundo inquérito, que será aberto esta semana, e pode indiciar três policiais militares de Pernambuco pelo crime de tortura.
Mesmo sem a localização da arma ou objetos do roubo, José Alex e Diego Cruz foram encaminhados à Delegacia de Ouro Preto, onde foram autuados com base no depoimento da dona do posto e de outras vítimas do assalto. Durante o procedimento, os jovens puderam avisar às famílias.
No Hospital de Traumas de Petrolina, onde Diego foi atendido e Alex passou três dias internado, houve mais terror. "Os policiais me ameaçavam dizendo que eu tinha uma hora para começar a falar", contou Diego. "Me levaram a uma área chamada de pantanal, tiraram minhas roupas, colocaram um saco na minha cabeça e me bateram, me mandando mudar de história", disse.
Na delegacia, as agressões teriam continuado e incluíam a simulação de afogamento em um vaso sanitário. A tortura só terminou quando Diego foi conduzido à penitenciária da cidade, onde passou seu aniversário de 19 anos e outros 38 dias encarcerado. No dia seguinte à notícia da morte de Alex, Diego disse que dois policiais que não participaram do espancamento continuaram com as ameaças na prisão.
Desesperada, a família do jovem procurou a proprietária do posto de combustíveis com uma foto. O pai contou que Maria Claudenice e outras testemunhas de acusação admitiram não ter mais certeza de que eles seriam os assaltantes. Os depoimentos registrados na audiência, realizada em 19 de fevereiro, foram marcados por contradições sobre quem estaria com a arma, quem pilotava a moto ou se houve disparos. Por falta de provas consistentes, o juiz Cícero Ferreira Silva, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Petrolina, assinou o alvará de soltura. Diego foi solto no mesmo dia. Em dois meses de investigação, o delegado Jean Rockfeller, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, chegou à conclusão de que os jovens eram inocentes. Os verdadeiros assaltantes não foram encontrados.
O delegado indiciou cinco pessoas. Maria Claudenice da Silva, 38 anos, dona do posto Umburuçu, além dos funcionários Nilton Ribeiro, Eliomar Lopes e Adriano da Silva, que teriam participado do espancamento. Os quatro responderão por lesão corporal seguida da morte de Alex. O quinto indiciado é o bombeiro do 9º Batalhão da Polícia Militar da Bahia, Gracenildo Santos, 34, que responderá por homicídio qualificado e consumado por motivo fútil. Ele foi uma das vítimas do assalto ao posto Umburuçu que foi até o posto Paizão. O caso tem um sexto envolvido, que não foi indiciado por ser menor de 18 anos. Uma cópia do inquérito será encaminhada à Vara da Infância e da Juventude.
De acordo com a assessora de imprensa da Secretaria de Defesa Social (SDS), Paula Cysneiros, independentemente do caso, a punição para um militar é diferenciada. "A exclusão é o máximo que eles podem pegar. Nesse caso, se o desligamento acontecesse antes da conclusão do inquérito da polícia civil, ele passaria a responder como civil, respondendo ao código penal. Caso contrário, ele seria julgado pela auditoria militar do Tribunal de Justiça e caberia, a quem fosse julgar, pedir ou não o desligamento", explica.
Os crimes
Depois de sair de um torneio de futebol no N-11, em Petrolina, uma amiga pede a Diego e José Alex para levarem uma encomenda. No trajeto, param no Posto "Paizão" para abastecer a moto. Lá são acusados por Maria Claudenice de assaltar o posto Umburuçu, minutos antes
Ao ouvirem os gritos de acusação, clientes, seguranças e vítimas do assalto começam a espancar os jovens. Policiais são acionados e levam os dois à Delegacia de Ouro Preto. Muito feridos, Diego e José Alex são levados ao Hospital de Traumas de Petrolina
O estado de saúde de José Alex piora e ele morre três dias depois de internado. Diego Cruz deixa o hospital às 2h acompanhado de três policiais e alega ter sido espancado em um matagal que fica na área da unidade de saúde. Disse que tiraram sua roupa e colocaram um saco na sua cabeça
Por volta das 3h, Diego e policiais retornam à Delegacia de Ouro Preto. Ainda ferido, Diego Cruz diz que foi torturado mais uma vez. Segundo ele, as agressões continuaram no banheiro, onde simularam afogamento com a cabeça dele dentro do vaso sanitário
Andrea Soares da Silva e José Manoel, pais de José Alex, estampam no peito o rosto do filho morto. Para eles, a Justiça deve prevalecer. Fotos: Regina Lima/Esp.DP/D.A Press |
Confira o especial sobre o caso
A história de injustiça, violência e morte está narrada no inquérito policial entregue ontem à Central de Inquéritos do Ministério Público de Pernambuco em Petrolina. O documento pede o indiciamento de cinco suspeitos pelo crime de homicídio e lesão corporal. Diego Pereira Cruz acusa policiais militares de o terem espancado em um matagal e na delegacia para onde foi levado depois de ter recebido alta do hospital, na mesma noite. A suposta violência policial será investigada em um segundo inquérito, que será aberto esta semana, e pode indiciar três policiais militares de Pernambuco pelo crime de tortura.
Mesmo sem a localização da arma ou objetos do roubo, José Alex e Diego Cruz foram encaminhados à Delegacia de Ouro Preto, onde foram autuados com base no depoimento da dona do posto e de outras vítimas do assalto. Durante o procedimento, os jovens puderam avisar às famílias.
No Hospital de Traumas de Petrolina, onde Diego foi atendido e Alex passou três dias internado, houve mais terror. "Os policiais me ameaçavam dizendo que eu tinha uma hora para começar a falar", contou Diego. "Me levaram a uma área chamada de pantanal, tiraram minhas roupas, colocaram um saco na minha cabeça e me bateram, me mandando mudar de história", disse.
Na delegacia, as agressões teriam continuado e incluíam a simulação de afogamento em um vaso sanitário. A tortura só terminou quando Diego foi conduzido à penitenciária da cidade, onde passou seu aniversário de 19 anos e outros 38 dias encarcerado. No dia seguinte à notícia da morte de Alex, Diego disse que dois policiais que não participaram do espancamento continuaram com as ameaças na prisão.
Diego Cruz ao lado da mãe: sobrevivente. |
O delegado indiciou cinco pessoas. Maria Claudenice da Silva, 38 anos, dona do posto Umburuçu, além dos funcionários Nilton Ribeiro, Eliomar Lopes e Adriano da Silva, que teriam participado do espancamento. Os quatro responderão por lesão corporal seguida da morte de Alex. O quinto indiciado é o bombeiro do 9º Batalhão da Polícia Militar da Bahia, Gracenildo Santos, 34, que responderá por homicídio qualificado e consumado por motivo fútil. Ele foi uma das vítimas do assalto ao posto Umburuçu que foi até o posto Paizão. O caso tem um sexto envolvido, que não foi indiciado por ser menor de 18 anos. Uma cópia do inquérito será encaminhada à Vara da Infância e da Juventude.
De acordo com a assessora de imprensa da Secretaria de Defesa Social (SDS), Paula Cysneiros, independentemente do caso, a punição para um militar é diferenciada. "A exclusão é o máximo que eles podem pegar. Nesse caso, se o desligamento acontecesse antes da conclusão do inquérito da polícia civil, ele passaria a responder como civil, respondendo ao código penal. Caso contrário, ele seria julgado pela auditoria militar do Tribunal de Justiça e caberia, a quem fosse julgar, pedir ou não o desligamento", explica.
Os crimes
Depois de sair de um torneio de futebol no N-11, em Petrolina, uma amiga pede a Diego e José Alex para levarem uma encomenda. No trajeto, param no Posto "Paizão" para abastecer a moto. Lá são acusados por Maria Claudenice de assaltar o posto Umburuçu, minutos antes
Ao ouvirem os gritos de acusação, clientes, seguranças e vítimas do assalto começam a espancar os jovens. Policiais são acionados e levam os dois à Delegacia de Ouro Preto. Muito feridos, Diego e José Alex são levados ao Hospital de Traumas de Petrolina
O estado de saúde de José Alex piora e ele morre três dias depois de internado. Diego Cruz deixa o hospital às 2h acompanhado de três policiais e alega ter sido espancado em um matagal que fica na área da unidade de saúde. Disse que tiraram sua roupa e colocaram um saco na sua cabeça
Por volta das 3h, Diego e policiais retornam à Delegacia de Ouro Preto. Ainda ferido, Diego Cruz diz que foi torturado mais uma vez. Segundo ele, as agressões continuaram no banheiro, onde simularam afogamento com a cabeça dele dentro do vaso sanitário
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